quarta-feira, 17 de março de 2010

BRASIL - Direitos Humanos - A realidado do país aos 60 anos da Declaração Universal

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DIREITO DAS MULHERES

Art. 7. Tods são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.
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Elas estudam mais, trabalham mais e ganham menos. Mas sua participação avança em todos os setores da sociedade, quebrando resistências e contribuindo para a modernização e a democratização. Porque “sem as mulheres os direitos não são humanos”.

"O primeiro documento internacional a tratar
da proteção aos direitos humanos das mulheres
foi a Convenção sobre a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação contra a Mulher (mais
conhecida pela sigla em inglês Cedaw), adotada
pela ONU em 18 de dezembro de 1979. O governo
brasileiro da ditadura militar ratificou o documento
em 1981, mas com reservas, não se comprometendo
com os artigos 15 e 16 — que garantem,
respectivamente, o direito da mulher de se
movimentar livremente e de escolher onde morar,
e a igualdade dos gêneros na relação conjugal. Foi
sem esses dispositivos que a Convenção passou
a vigorar no país, em 1984, até que o Congresso
aprovasse novo decreto retirando as reservas em
1994, um ano depois da II Conferência Mundial
sobre os Direitos Humanos, em Viena.
A Declaração de Viena, adotada pela ONU em
junho de 1993, fez uma defesa veemente dos direitos
humanos da mulher, apoiada em denúncias
de reiteradas violações aos princípios definidos na
Cedaw, comprometendo os Estados-partes (185
países, em 2007) a promover a igualdade entre os
gêneros e combater a violência sexual e doméstica.
O espaço destinado à questão feminina nessa conferência
foi resultado da pressão dos movimentos
feministas por uma declaração específica sobre os
direitos humanos das mulheres, sintetizada na palavra
de ordem: “Sem as mulheres, os direitos não
são humanos”.
No ano seguinte, a Convenção Interamericana
para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra
a Mulher, promovida pela Organização dos Estados

Americanos (Convenção de Belém do Pará), deu
mais um passo importante ao admitir a responsabilidade
do Estado no combate à violência contra
a mulher também na esfera privada. A Declaração
de Viena só foi promulgada na íntegra no país em
2002, e a Convenção de Belém do Pará, ratificada
pelo Brasil em 1995, foi promulgada em outubro
de 1996.
As ações do Brasil para eliminar a discriminação
contra as mulheres foram reconhecidas pelo
Comitê para Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação contra a Mulher (órgão executivo
da Cedaw), da ONU, na avaliação do VI Relatório
Nacional do Brasil, em julho de 2007. A forma
participativa como estão sendo construídas
as políticas de igualdade de gênero do país, articuladas
pela Secretaria Especial de Políticas para as
Mulheres (SPM), criada em 2003, também mereceu
elogios do organismo internacional — o I e o II
Plano Nacional de Políticas para Mulheres (PNPM)
foram elaborados por assembleias que reuniram
mais de 200 mil mulheres no país (veja a entrevista
com a ministra da SPM na p. 80). Ainda
assim, o Cedaw recomendou “que se acentuem os
esforços para eliminar a lacuna entre a igualdade
de jure e de facto das mulheres e homens” para
erradicar a violência social e doméstica contra a
mulher, a desigualdade de gêneros no mercado de
trabalho, e combater a sobrecarga e outros prejuízos
advindos da resistência dos homens em dividir
os afazeres domésticos, combinação de fatores
que levam à menor presença da mulher em todas
as esferas de poder.

Informação anticoncepcional
Também houve queda nos diferenciais de fecundidade
referentes às camadas de menor e maior
renda, embora continue elevado entre as mais
pobres: 48% das mulheres com rendimento mensal
familiar per capita de até meio salário mínimo têm
três filhos ou mais. Ainda assim, o diferencial de
fecundidade entre as mulheres de renda mais baixa
e as mais ricas caiu de 3,3 filhos em 1992 para 2,6
filhos em 2007. O fenômeno se repete quando se
cruzam os dados de fecundidade e escolaridade: a
diferença de filhos entre as mulheres de menor e
as de maior escolaridade caiu de 1,8 filho em 1992
para 1,4 filho em 2007. A redução desse diferencial
pode ser parcialmente atribuída ao acesso à informação
contraceptiva: a Pesquisa Nacional de Demografia
e Saúde (PNDS), do Ministério da Saúde,
realizada pelo Cebrap (Centro Brasileiro de Análise
e Planejamento) entre 2006 e 2007, mostra que
99,9% das mulheres em idade fértil sabiam como
evitar a gravidez de forma adequada, percentual
que atingia os 100% entre as mulheres sexualmente
ativas sem parceiros fixos. O número das que usam
efetivamente algum método contraceptivo subiu
de 73,1% para 87,2% entre 1996 e 2006. O mesmo
fator pode explicar por que o número de partos realizados

pelo SUS em meninas de 10 a 19 anos caiu
26,7% entre 1997 e 2007, de acordo com dados do
Ministério da Saúde, apesar de cada vez mais mulheres
decidirem começar a vida sexual mais cedo.
Ainda assim, até julho de 2008, foram realizados
275.892 partos pelo SUS em jovens e adolescentes
nessa faixa etária.
A pesquisa do Ministério da Saúde aponta ainda
outros avanços no que se refere à saúde reprodutiva.
Em 1995, a média de consultas de pré-natal
para cada parto realizado no SUS era de 1,2 consulta;
em 2007, esse número já era de 5,7 consultas
de pré-natal para cada parto6. Entre as mulheres
que vivem no meio rural, o número das que não
fizeram o pré-natal caiu de 31,9% para 3,6% de
1996 a 2006.

Mães mais informadas
Entre 1996 e 2006, o percentual de crianças
entre zero e cinco anos com desnutrição crônica
caiu mais de 40% (de 13,5% para 6,8%). A queda foi
maior no quinto mais pobre da população, passando
de 30% para 11%. Nesse mesmo período, o percentual
de filhos de mães com menos de quatro anos de
escolaridade baixou de 28% para 11% das crianças,
e o percentual de filhos de mães com pelo menos
oito anos de escolaridade subiu de 32% para 62%,
outro sinal da crescente escolarização das mulheres.
Nesse quesito, aliás, as mulheres vêm sobressaindo,
principalmente as que fazem parte da população
economicamente ativa em áreas urbanas,
que têm, em média, nove anos de estudo — um ano
a mais do que os homens. Em 2007, as mulheres superavam
percentualmente os homens entre o grupo
de trabalhadores ocupados com mais de 12 anos de
estudo e entre os estudantes do nível superior: com
exatamente os mesmos 57,1% de representação nas
duas situações, segundo a Síntese dos Indicadores
Sociais do IBGE, 2008.
No Nordeste — onde a queda da taxa de desnutrição
atingiu o maior índice regional, de 22% para
6%, os números também revelam evolução na situação
da mulher. No Piauí, por exemplo, elas estudam
quase dois anos a mais do que os homens, anota o
IBGE e conclui: “Vale a pena observar que mesmo
nas regiões onde os valores culturais são reconhecidamente
mais tradicionais, as mulheres têm se
destacado em termos de escolaridade e na condição
de pessoa de referência das famílias. No Norte e no
Nordeste, a proporção das mulheres nessa condição
é de 34,7% e de 32,1%, respectivamente”.
Chefes de família
O percentual nacional de mulheres que ocupam a
posição de “pessoa de referência da família” (expressão
que substitui no IBGE o coloquial “chefe da família”)
está em ascensão desde a última década — entre
1997 e 2007 passou de 24,9% para 33%, o que
representa 19,5 milhões de famílias encabeçadas por
mulheres8. Mais da metade (52,9%) das famílias monoparentais
(com apenas um dos pais em casa) está
nessa condição. Em 1997, apenas 2,4% das famílias
formadas por casais com filhos — que correspondiam
a 57% do total de famílias brasileiras — eram chefiadas
por mulheres; em 2007, embora tenha caído o
número de famílias compostas por casais com filhos
— para 51,6% do total —, a proporção das mulheres
que as chefiam subiu para 11,2%. Computados os
números também de arranjos de casais sem filhos, as
mulheres chefiam 4,1 milhões de famílias9.
De acordo com o mesmo estudo do Ipea, o aumento
da responsabilidade da mulher pelo sustento
da família está relacionado a uma série de fatores,
destacando-se dois: longevidade feminina aliada ao
envelhecimento da população (em quase 27% das
famílias chefiadas por mulheres, elas têm acima de
60 anos e moram sozinhas); e o aumento da participação
das mulheres no mercado de trabalho — em
1992, 43,4% das mulheres se encontravam ativas,
número que subiu para 46,7% em 2007, enquanto a
taxa de atividade masculina no mesmo período caiu
de 72,4% para 67,8% —, com consequente aumento
da contribuição das mulheres à renda familiar
— entre 1992 e 2007, esta passou de 30,1% para
39,8% —, principalmente entre as casadas, grupo em

que a proporção da contribuição na renda passou de
39,1% para 62,5%.
Ainda assim, os homens resistem a compartilhar
com as parceiras a responsabilidade pela casa e pelos
filhos, como observa o Ipea: “Apesar de a mulher
brasileira estar assumindo o papel de provedora, ela
continua sendo a principal responsável pelo cuidado
doméstico, o que não representou variações expressivas
no período”. O mesmo estudo mostra que a
proporção de mulheres ocupadas que se dedicavam
a afazeres domésticos em 2007 era de 89,6%, e a
dos homens ocupados, 50,4%. Ainda mais contundente
é a diferença entre o tempo despendido nos
afazeres domésticos pelos ocupados de ambos os sexos:
22,2 horas semanais para elas contra 9,6 horas
para eles. Mesmo entre os casais em que a mulher
está ocupada e o homem não, elas gastam mais
tempo com o trabalho doméstico do que eles: 24,19
horas semanais contra 15,16 para eles.
O estudo também assinala que, apesar das
transformações na estrutura da família brasileira,
esta continua a ser “a esfera social mais refratária
e resistente em direção à igualdade entre homens
e mulheres”. O sinal mais trágico da persistência
da dominação masculina nas relações familiares
de gênero é a violência doméstica, que continua a
atingir cerca de 20% das brasileiras — declaração
espontânea obtida por pesquisa da Fundação Perseu
Abramo em 2001. Mesmo com a subnotificação, as
Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher
registraram uma média de 400 mil boletins de
ocorrência por ano entre 2003 e 2005, número que
deve crescer com a aplicação da Lei Maria da Penha,
aprovada em 2006 e considerada uma das maiores
conquistas do movimento das mulheres (veja reportagem
sobre a Lei na p. 82).

Discriminação no mercado de trabalho
Um estudo do Pnud que investigou em 2006 a
diferença entre a média salarial por hora de homens
e mulheres ao longo da vida profissional em três
países — África do Sul, Brasil e Tailândia — constatou
que no Brasil o salário médio das mulheres entre
15 e 25 anos supera o dos homens em 10%. A partir
dos 26 anos, quando elas assumem casamento e

maternidade, eles passam a receber proporcionalmente
cada vez mais, atingindo o ápice do diferencial
na faixa de 46 a 55 anos. O estudo faz duas
sugestões, incorporadas às políticas públicas brasileiras:
que os governos subsidiem as creches como
forma de aumentar as oportunidades profissionais
das mulheres e encorajem as meninas a seguir
profissões em áreas como ciências e matemática,
mais bem remuneradas e ainda predominantemente
masculinas."

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