domingo, 30 de novembro de 2008

Estado de Exceção - Parte Final

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Ligar a vida ao direito, e abandonar a vida a ele...

Se é verdade que a articulação entre vida e direito, produzida pelo estado de exceção é eficaz, mas fictícia, não se pode, porém, extrair disso a consequência de que, além ou aquém dos dispositivos jurídicos, se abra em algum lugar um acesso imediato áquilo de que representam fratura e, ao memso tempo, a impossível recomposição. Não existem, primeiro, a vida como dado biológico natural e a anomia - ausência de lei, como estado de natureza e, depois sua implicação no direito por meio do estado de exceção. Ao contrário, a própria possibilidade de distinguir entre vida e direito, anomia e nomos concide com a articulação na máquina biopolítica. A vida pura e simples é um produto da máquina e não algo que pré-existe a ela, assim como o direito não tem nenhum fundamento na natureza ou no espírito divino.

Vida e direito, anomia[1] e monos[2], auctoritas e potestas[3] resultam da fratura de alguma coisa a que não temos outro acesso que não por meio da ficção de sua articulação e do paciente trabalho que, desmascarando tal ficção, separa o que tinha pretendido unir. Mas o desencanto não resistiu o encantado a seu estado original: segundo o princípio de que a pureza nunca está na origem, ele lhe dá somente a possibilidade de acender a uma nova condição.

Mostra o direito em sua não-relação com a vida e a vida em sua não-relação com o direito significa abrir entre eles um espaço para a ação humana que, há algum tempo, reinvindicava para si o nome de política. A política sofreu um eclipse duradouro porque foi contaminada pelo direito, concebendo-se a si mesma, em casos, como poder constituinte, quando não se reduziu simplesmente a poder de negociar com o direito. Ao contrário, política é aquela ação que corta o nexo entre violencia e direito. E somente apartir do espaço que assim se abre, é que será possível colocar a questão a respeito de um eventual uso do direito após a desativação do dispositivo que, no estado de exceção, o ligava à vida. Teremos então, diante de nós, um direito puro, no sentido em que Benjamin fala de uma língua "pura" e de uma "pura" violência. A uma palavra não coercitiva, que não comanda e não proíbe nada, mas diz apenas ela mesma, corresponderia uma ação como puro meio que mostra só a si mesma, sem relação com o objetivo. E, entre as duas, não um estado original perdido, mas somente o uso e a práxis humana que os poderes do direito e do mito haviam procurado capturar no estado de exceção.[4]

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[1] Ausência de lei.
[2] Do grego: μονογενης [monogenês] (Adjetivo). De: μονος [monos] "um", "único", "só.
[3] Ver " Estado de Exceção - Parte I"
[4] AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção.

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